O
HOMEM DIANTE DA MORTE
Na década de quarenta, Daniel-Rops, escreveu um livro com um título desafiante:
“morte, tua vitória onde está?”; com a epígrafe escrita por John Donne.
Desde a invenção da palavra escrita, memorialistas, historiadores,
ficcionistas, literatos, poetas, se dedicaram a escrever sobre a morte. A morte
do homem. O homem diante dela. Suas contorções, seus esgares, seu balbucio de
pavor ou esperança, de fé e descrença, sua coragem e sua covardia. De Homero à
Moliére a morte vem sendo contada de várias maneiras, mas só duas se tornaram
imortais: A de Sócrates e a de Cristo. Platão e os evangelhos esgotaram o
assunto e, não houve Dante ou Tolstoi ou Dostoiévski que tenham escrito tanto
sobre ela.
Escreveu Plínio o velho: “a aliança entre nós e o céu é de tal ordem que os
astros devam extinguir-se com nossa morte” e Sêneca escreveu: “quantos deuses
incomodados com a vida de um só homem”. Durante as guerras civis no tempo de
César, tendo Lúcio Domício, aprisionado nos abruzos, se envenenado,
arrependeu-se logo em seguida, ocorre que alguém decidido a morrer não o tenha
conseguido e se ferisse novamente duas ou mais vezes, sem resultado, em virtude
da revolta da carne que impede o braço de golpear profundamente a mesma.
Enquanto se instruía o processo de Plauto Silvano, Urgulânia, sua avó,
passou-lhe um punhal com o qual ele não conseguiu se matar mandou então que
seus servidores lhe cortassem as veias; Albucila, no tempo de Tibério, querendo
suicidar-se, golpeou-se com insuficiente vigor, o que deu tempo a seus inimigos
de a socorrerem e a fazerem morrer a seu bel prazer torturando-a; foi também o
que aconteceu a Demóstenes, depois de sua derrota na Sicília; C. Fimbria,
falhando por falta de energia, pediu ao criado que a matasse, ao contrário de
Ostório, que embora não pudesse usar o braço, desdenhou a ajuda do lacaio, se
não para manter o punhal reto e firmemente, e jogou-se sobre a arma
traspassando sua garganta; o imperador Adriano mandou seu médico marcar com um
círculo no peito o lugar que deveria ser golpeado por quem ele encarregasse de
matá-lo. Eis porque César quando lhe perguntaram qual o gênero de morte mais
desejável, respondeu: “a menos premeditada e a mais rápida”; “uma morte rápida”
observou Plínio, “é a grande felicidade da vida”.
Pompônio Ático, a quem o orador Cícero escreveu cartas, achando-se enfermo, não
mais comeu e morreu de fome; o poeta chinês Lí-Po morreu afogado nas águas de
um rio ao tentar agarrar o reflexo da lua; o literato Crísipo no ano de 2.000
a.c, cavalgava num burro que havia sido embebedado, este quis no caminho comer
figos, vendo a cena, Crísipo caiu na gargalhada, caindo do burro e morrendo; o
dramaturgo Ésquilo, morreu quando uma tartaruga lhe caiu sobre a cabeça, caída
da boca de uma águia; informa o historiador Flávio Josefo que Herodes morreu
quando seu órgão sexual gangrenou.
Escreveu o poeta romano Horácio: “salvar um homem contra sua vontade é como
matá-lo” e Cícero escreveu: “não quero morrer, mas é-me indiferente estar
morto”. Antes de morrer disse Beethoven: “já é tarde, não posso mais ouvir”;
Casemiro de Abreu disse: “a morte é só isso?”; Dante: “vinde a mim ó Deus”;
Luiz XIV: “pensei que fosse mais difícil morrer” e Quintino Bocaiúva disse:
“para este frio não há cobertor”.
O filósofo Epícuro dizia que a morte ou era passagem para um lugar paradisíaco
ou um sono profundo, como essas noites sem sonhos. A morte ali à cabeceira ou à
emboscada, é a grande personagem, não o homem, pobre ator repetitivo da mesma
cena, que só não merece desdém porque mal ou bem escrita, pertence-nos.
Sócrates dá um repelão ao lembrar que não está ainda quite com a vida: “Críton,
devo um galo a Asclépio! Não te esqueças de pagar esta dívida!”. Pronto já pode
morrer em paz.
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